Naveganndo com 2 enes

Sempre falei: vou criar um blog, escrever um livro, compor uma música. Pois é, nunca fiz, até hoje. E o que me levou a finalmente tirar mais esse projeto da minha cabeça do papel? O sistema de classificação Bethesda.

Sim, descobri essa semana que tenho um nódulo classificação Bethesda VI, ou seja, maligno. Carcinoma Papilífero. Foi muito difícil não ter ao menos a margem do “Suspeito de malignidade” para me apoiar. Mas ainda assim, ganhei na loteria dos cânceres, e tirei o menos agressivo e com mais chances de cura total.

Afinal, não foi tão ruim assim.

E isso me deu o empurrão que eu precisava para começar meu blog. Mas só para falar sobre câncer? Não. Mas também sobre cinema, comida, trabalho, o mistério da vida e tudo mais, e sobre como é navegar nesse mar de enes. O câncer foi só o que recolheu as âncoras e me fez zarpar.

Prazer, Julianna com 2 enes de navio.

Internanndo e Melhoranndo

É, o tempo voou, eu tentei voltar ao trabalho quando passaram os 15 dias  da cirurgia, mas não teve jeito mesmo. Até escovar os dentes era uma luta, e nessas horas a gente percebe quantos músculos são necessários pra realizar qualquer tarefa do dia a dia: eu sentia todos, cada um deles, me rasgando por dentro. Sério, não sei como o Popeye aguentava aqueles braços enormes.

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Conversei com a endócrino, ela me deu o atestado pro restante do período até o iodo (claro que não sem um “Eu avisei que você não ia aguentar”) e fiquei entre minha cama e consultas. Depois de 35 dias sem hormônios, eu parecia mais o Baby da família dinossauro (de tão inchada) com a energia e a força da Olívia Palito.

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Dia 18 de maio fomos, eu e minha mãe, pro hospital, fazer a internação pra radioterapia com iodo. Não pude levar nada (até a roupa íntima que ficou comigo teve que ir pro lixo depois), mas pelo menos tinha um computador e TV no quarto.
Dormi, acordei, recebi as orientações, e depois de algumas horas veio a médica com uma roupa de chumbo e um pote  que mais parecia uma bomba com o comprimido de iodo radioativo dentro. Tomei, e tive de ficar 4h deitada, evitando salivar ao máximo (e nessas horas parece que a cabeça manda mais saliva ainda, só de sacanagem!). Depois dessas 4h mandaram uma sopa intragável, então fiquei o dia todo à base de água e suco de caixinha. No dia seguinte foi: café da manhã – dramim – banho – cama – almoço – dramim – banho – cama – lanche… E assim até 16h30, quando o médico nuclear veio medir a radiação e: há, liberada só hospital! 🙂

Quando meu pai chegou pra me buscar, eu só conseguia pensar em uma coisa: MC Cheddar com cheddar extra e batata grande *-* Passamos no Drive thru, já que eu não podia entrar no restaurante e fomos pra casa (vazia, porque precisava ficar até sexta isolada do mundo). Comecei a reposição do hormônio na quarta, e agora começa a briga pra regular tudo direitinho e fazer o corpo voltar a funcionar normalmente.

E, pra finalizar a novela, segunda-feira voltei no cirurgião pra ver o resultado dos exames pós iodo, e: tudo limpo! O iodo queimou tudo o que sobrou, agora é só acompanhar a cada 3 meses por um tempo, depois a cada 6 meses por uns 5 anos, pra não correr o risco de voltar 🙂

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E o que me resta é reajustar as velas, içar a âncora e voltar a navegar nesse mar de enes!

Recuperanndo

Demorou, mas segunda chegou, segunda passou, e depois o tempo voou! Dia 27 finalmente fui pegar o resultado da biópsia e tirar meus pontos. Cheguei no hospital, sentei na maca, a enfermeira colocou meus dados no computador, imprimiu o laudo, me olhou com cara de enterro e saiu. Voltou junto com o médico (também com cara de enterro), e começou a tirar meu curativo.

Enquanto isso, o médico, super simpático, disse que meu nódulo era maligno mesmo, e que vou precisar fazer a iodoterapia, e leu o laudo pra mim. Acho que eles até estranharam minha reação! A louca do hospital!

Doutor (~cara de enterro): – Seu nódulo da tireóide deu Carcinoma Folicular, e como estava grande, você vai precisar mesmo fazer o iodo.
Eu (~sambando na cara da desgraça): Ah, isso eu já imaginava! Mas e os nódulos da cervical?
Doutor (~meio sem saber qual cara fazer): Os da cervical não foram afetados. Exemplificando, eram benignos.
Eu (~rindo, a lá psicopata): UFA! Agora fico mais aliviada, dos males, o menos pior!

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Então, agora o que me resta é fazer uma dietinha de leve pra tomar o iodo radioativo dia 18, e queimar logo o que não quis sair na mão do cirurgião.

Mas olha, como faz falta essa minha brabuleta viu!

Operanndo

Quase não consigo a tempo, mas depois de uma novela mais dramática que Maria do Bairro e mais batida que A Usurpadora com o convênio enrolando para liberar a autorização, deu certo! Minha cirurgia ficou para dia 15/04, as 10h.

Fui correndo pra casa arrumar minhas coisas para poder me internar, afinal, a confirmação só saiu às 20h do dia 14/04.

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Foi puxado, mas às 8h30 do dia 15, lá estávamos (eu, minha mãe e o maridão) abrindo a ficha da internação. Às 10h em ponto um enfermeiro veio me buscar pra eu me trocar, e me levou de maca pro centro cirúrgico.

UFA, a cirurgia correu bem, cheguei no quarto às 17h30 reclamando com todos os enfermeiros que eu estava morrendo de fome (gorda master!). Comi, passei mal a noite toda, mas no dia seguinte já estava bem de novo 😀

O médico passou no quarto, me disse que o nódulo maior era cancerígeno mesmo, sem choro nem vela, tinham encontrado linfonodos com nódulos na minha cervical e feito o esvaziamento central, e agora falta esperar a biópsia desses nódulos cervicais pra ver se eram malignos também ou não.

Segunda estou de volta no hospital, pra tirar esse caninho maledito dreno, e saber quando vou ter o resultado do anatomopatológico!

E lá vamos nós! 😀

Inovanndo

Inovar às vezes faz bem né? Descobri que eu estava mesmo precisando disso!

Nunca tive cabelo curto, sempre usei o clássico rabo de cavalo, por ter madeixas um tanto terríveis indomáveis. Nos últimos 4 anos da minha vida, fui a moça/garota/mulher/louca dos dreads. Dread sintético, e natural desde outubro.

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Infelizmente, meu cabelo anda caindo muito (não, não estou fazendo quimioterapia e nem vou precisar, ainda bem!), e sei que depois da operação vai cair ainda mais pelo tempo que ficarei sem hormônios, então, que tal mudar já? Se nada der certo, ainda posso  raspar!

Decidi. Tomei coragem. O maridão cortou meus dreads comigo chorando a la Carolina Dieckmann em Laços de Família só que não e 2 dias depois consegui horário num salão para finalmente mudar o visual. O resultado:

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É, acho que todos precisamos mudar de vez em quando, seja na aparência ou na atitude. Claro que não precisa ser tão radical quanto eu fui (e ainda preciso me acostumar), mas, nesse mar de enes, às vezes, quanto mais, melhor 😉